O BNDES lançou na sexta-feira passada (28) o edital Viva Pequena África, no Museu da História e da Cultura Afro-Brasileira (Muhcab), na Gamboa, Rio de Janeiro. Por meio da seleção pública, vai ser escolhida uma instituição sem fins lucrativos para gerir um fundo não reembolsável de R$ 20 milhões de investimentos na região, reconhecida por preservar heranças culturais africanas. As inscrições vão até 11 de setembro pelo site bndes.gov.br/vivapequenaafrica e o resultado vai ser divulgado em 20 de novembro, Dia da Consciência Negra.O presidente do BNDES, Aloizio Mercadante, a ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco, o secretário municipal de Cultura, Marcelo Calero, e integrantes do Comitê Gestor do Cais do Valongo participaram da cerimônia.
A AFBNDES apoiou o evento, estando presente a vice-presidente da entidade, Pauliane Oliveira. “É com muita satisfação e muito orgulho que vejo o BNDES e a AFBNDES, duas instituições das quais tanto me orgulho, atuando juntas nesse movimento urgente e necessário de resgate e valorização da cultura afro-brasileira”, disse Pauliane.
O gestor do fundo será responsável por apoiar projetos culturais, promover reformas e capacitar pessoas que desempenhem atividades relacionadas à valorização da identidade cultural afro-brasileira. Também fará o levantamento de estudos, acervos e necessidades do território da Pequena África. Para participar do edital, é preciso seguir alguns requisitos de equidade racial, como ter na equipe um mínimo de 30% de pessoas autodeclaradas negras, ter histórico de ações em prol da equidade racial e propor ações afirmativas nesse sentido.
Aloizio Mercadante disse que o governo federal está comprometido com o desenvolvimento da região, por entender a importância que ela ocupa na história do país. “O BNDES é a instituição responsável por mais da metade dos investimentos de reconstrução do patrimônio histórico do Brasil. Vamos resgatar um patrimônio que precisa ser valorizado dada a importância da história do povo negro para o país. Hoje, estamos iniciando um processo de estímulo ao turismo e atração de cada vez mais parcerias”, anunciou. Sobre a região da Pequena África, moradores e instituições locais, acrescentou: “Não queremos fazer um projeto para retirar as pessoas que resistiram e que construíram este espaço. Isso aqui é o pré-sal do movimento negro. Então, quem está aqui tem que ficar, porque esta é a riqueza do lugar”, disse.
“Nós temos aqui hoje a música, a culinária, a religiosidade, os ritos. Diversas formas de expressão dessa cultura que nós queremos preservar e valorizar. Para permitir recontar e revisitar a história do povo negro, que deu uma imensa contribuição cultural, econômica e social para o Brasil. Então, o BNDES está fazendo esse edital em parceria com o comitê gestor da Unesco, que reconhece como patrimônio histórico da humanidade o Cais do Valongo”, complementou.
O lançamento do edital aconteceu na semana em que foram noticiadas novidades nas investigações do assassinato da vereadora Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes. Irmã de Marielle, a ministra Anielle Franco lembrou a história de luta da família ao falar da importância de iniciativas que valorizam a memória da população negra: “Todo mundo que está aqui tem história de resistência. Que passa pela minha história de vida, da minha família e da minha irmã. Se tem um lugar que a gente considera um berço ancestral, a Pequena África é esse espaço”, disse. “Para mim, tem sido uma responsabilidade imensa concretizar um sonho e fortalecer esse lugar de um povo que está há tantos anos lutando. Não tem sido dias fáceis. Mas tem sido dias de muito afeto e dedicação. Para além desses centros de memória, a gente precisa também seguir realizando política públicas concretas”, destacou Anielle.
Iniciativa Valongo – Como informa a Agência Brasil, o edital Viva Pequena África está inserido na Iniciativa Valongo, um plano de ações para fortalecer e organizar as instituições que atuam no território da Pequena África. Em uma primeira fase, além da escolha do gestor do fundo de R$ 20 milhões, estão previstas a elaboração do conceito do futuro Museu Nacional da Herança Africana e a estruturação de projetos para o Distrito Cultural da Pequena África. Este último inclui o Museu da Memória, o Centro de Interpretação do Cais do Valongo e o Laboratório de Arqueologia Urbana (LAAU).
Nessa primeira fase, também haverá mapeamento de prédios públicos históricos ociosos na região. A ideia é que eles sejam utilizados para abrigar universidades, bibliotecas e empresas de tecnologia. Uma segunda fase está prevista para o segundo semestre de 2024, quando vão começar as obras para restaurar o prédio Docas Dom Pedro II, erguido no período imperial pelo engenheiro negro André Rebouças.
“Nós começamos com a primeira fase, para não repetir erros anteriores, quando o Estado investe em projetos muito bonitos e interessantes, mas aqueles que viviam lá, construíram e resistiram são afastados pela especulação imobiliária”, disse o presidente do BNDES, Aloizio Mercadante. “Na segunda fase, estimamos algo próximo a R$ 200 milhões para concluir a obra [do prédio Docas]. Mas ainda tem muita conversa para fazer com os parceiros privados para montar o orçamento e o projeto”, contou.
A Iniciativa Valongo é gerida por dois grupos independentes e complementares. O primeiro deles é um Grupo de Trabalho Interministerial que, além do BNDES, inclui os ministérios da Cultura, da Igualdade Racial e dos Direitos Humanos e da Cidadania; o Instituto do Património Histórico e Artístico Nacional (Iphan); a Fundação Palmares; o Instituto Brasileiro de Museus (Ibram); e a prefeitura do Rio como convidada permanente. O segundo é o Comitê Gestor participativo do Cais do Valongo, que inclui 15 instituições representativas da sociedade civil e 16 governamentais nas esferas federal, estadual e municipal.