VÍNCULO 1375 – Não tem muito tempo colegas do Banco tomavam como fato consumado que tínhamos perdido o debate na opinião pública. A “caixa-preta” do BNDES levaria décadas para ser superada. Repetimos em diversas oportunidades e espaços – nos editoriais, nas visitas aos andares, nas plenárias realizadas no térreo, na única conversa que tivemos com o presidente Montezano – que o tema da “caixa-preta” deveria ser enfrentado com persistência, conquistando os formadores de opinião, e com paciência, entendendo que a convicção dos formadores de opinião acabaria por afetar decisivamente a opinião pública.
Os fatos estavam do nosso lado. E se perdermos a convicção de que a verdade é uma aliada poderosa, nos rendemos para o cinismo absoluto. Já havia demonstrações importantes de revisão da opinião pública quando o atual presidente do BNDES foi empossado. No primeiro editorial depois da posse de Montezano (“As cinco metas de Montezano”, VÍNCULO 1354, de 22/07/2019), afirmamos o que em retrospecto se revelou profético:
“Há avanços claros na percepção da opinião pública esclarecida sobre a situação do BNDES em termos de transparência. Temos que persistir nesse caminho. Hoje o principal propagador de notícias falsas sobre o BNDES é o próprio governo federal. E é tão provável que haja recuo nesse tema, como haja recuo no tema do kit gay etc. O que podemos esperar é que esse discurso perca a credibilidade junto à opinião pública mais esclarecida e que com o tempo o presidente e seus filhos encontrem outros inimigos para animar sua base eleitoral.
Não faz sentido uma reviravolta no tratamento do tema. A maior contribuição que o novo presidente poderia dar a esse debate é se ater aos fatos e afirmar o que fizeram TODOS os seus antecessores desde o fim do governo do PT (estamos falando de quatro ex-presidentes): afirmar que é nonsense a referência à ‘caixa-preta’. Quem sabe a confiança de que goza junto ao presidente da República possa fazer diferença”.
No final das contas, com alguns percalços e tentações – “jatinhos”, por exemplo –, o que a atual diretoria do BNDES fez foi exatamente o que previmos. E o papel da opinião pública mais qualificada foi fundamental. O relatório da última CPI do BNDES foi recebido com escárnio pela imprensa, as decisões judiciais sobre a denúncia do MPF não foram apenas de rejeição, mas de enfática negação de evidências sobre malfeitos no Banco. Sabíamos também que a consultoria americana divulgaria seus resultados, o que acabou acontecendo com quase um ano de atraso. A fake news sobre os jatinhos foi rechaçada em quase todos editoriais de uma imprensa predisposta a bater no BNDES. Diante da falta de qualquer evidência de malfeitos, o que restava ser feito e dito pelo presidente?
Bom que o presidente Montezano fez, ao fim, o que era correto. Teve coragem de apresentar o que os fatos sugeriam. Teve que se arriscar a informar a verdade ao presidente da República, sob ameaça crescente de ficar contra a opinião pública esclarecida, que o Banco que ele preside não tem história de malfeitos.
Mas isso não acabou ainda. É hora de explicar e contar direito a história das operações de comércio exterior. É hora de ficar claro que o BNDES não vai receber calote de Cuba. É hora de explicar que o fundo que garante as exportações de serviços de engenharia é lucrativo e capaz de absorver o impacto de eventuais inadimplementos. E ainda, que o papel responsável de um governo que está preocupado com os efeitos desses inadimplementos é negociar com os países que suspenderam pagamentos e não os hostilizar por razões exclusivamente demagógicas e eleitorais. É hora de agir de forma muito firme e, publicamente, responder declarações de ministros do TCU sobre as operações de comércio exterior.
Além disso, no molde do que fez a Petrobras, seria fundamental que houvesse um pedido de desculpas aos funcionários do BNDES que tiveram suas vidas pessoais e suas reputações comprometidas.
Felizes porque a justiça começa a ser feita em relação ao BNDES, fechamos este ano de 2019 esperançosos de que a virada começou. O mito da “caixa-preta” é o mais popular dos que assombram o BNDES, mas não é o único. Assim como ele caiu, cairão também os mitos plantados pelo Ministério da Economia e pelos economistas amigos do mercado financeiro.
Feliz Natal e um bom Ano Novo para todos!