A tensão do início da contingência no BNDES, a nova rotina familiar, a adaptação às ferramentas do trabalho remoto, os ganhos com o home office, a falta do trajeto ao Banco, das atividades na baia, do convívio com os amigos… Não é fácil a vida em quarentena
Fabiana Schneider – Advogada do BNDES. Trabalha na AJ2/JUAST/GEJUAST1
O começo
Desde o dia 16 de março, quando as medidas para o plano de contingência se iniciaram no Banco, fui colocada em quarentena. Cheguei a ir trabalhar naquele dia, confesso que já meio assustada. Tinha sido escolhida pela minha gestora para comparecer até a quarta-feira daquela semana, um dia antes de todos entrarem definitivamente no home office.
Foi uma chegada tensa. Parei o carro na garagem e mesmo antes de passar na catraca tive que responder a um questionário feito por uma enfermeira e em seguida tive minha temperatura medida por outra. As pessoas já mantinham a distância de mais ou menos um metro uma das outras na fila para entrar. Máscaras eram dadas para aquelas que relatavam sentir algum sintoma de gripe ou mal-estar. Foi ali, naquele momento, que tive contato pela primeira vez com o medo que essa pandemia traria para as nossas vidas a partir de então.
O Banco já estava bem mais vazio do que o normal, ainda assim fiquei temerosa de esperar no hall dos elevadores para subir, de tocar no botão pra escolher meu andar, de partilhar o elevador com pessoas que poderiam estar contaminadas sem sequer saber disso. Pronto. Cenário paranoico perfeito! Acho que o grande mal da batalha contra esse vírus é esse: como se proteger de um inimigo invisível? Por mais que adotemos as medidas de prevenção, será que terá sido suficiente para escapar ileso? E olha que gozo de boa saúde e não sou hipocondríaca ou cheia de manias de doença. Mas a chegada dessa doença veio de forma tão avassaladora que mesmo as pessoas mais tranquilas começaram a se sentir assustadas. Às vezes o medo vem não porque podemos contrair o vírus, mas porque queremos proteger a todo custo nossos entes queridos incluídos em algum grupo de risco.
Após algumas horas trabalhando, recebi a ligação de uma enfermeira da FAPES pedindo que eu fosse para casa, pois as lactantes tinham sido incluídas no grupo de risco. Tenho uma bebê de 10 meses. Foi assim que se iniciou minha quarentena e meu isolamento.
Primeira semana
A primeira semana foi necessária para tomar pé da situação, preparar a família para a nova rotina, fazer algumas compras de supermercado, dispensar colaboradores, conversar com as crianças (além da minha bebê, tenho uma enteada de 9 anos), organizar o espaço em casa para as atividades de trabalho e baixar os aplicativos de teleconferência e comunicação a distância.
O trabalho fluiu de forma meio desorganizada, cada um fazendo o que dava da maneira que melhor conseguia. Sem acesso VPN, minhas atividades nessa semana ficaram mais limitadas. É incrível o nosso grau de dependência das ferramentas tecnológicas, de modo que quando não conseguimos usá-las parece que estamos “mutilados” (decapitados!) e somos menos capazes. Fizemos algumas calls e os grupos de WhatsApp bombaram! Mas ao final da semana, meio aos trancos e barrancos, as tarefas pactuadas foram entregues.
Segunda semana
A segunda semana de quarentena começou mais organizada. Alguma rotina na casa já tinha sido estabelecida, a divisão das tarefas domésticas também. Com as ferramentas de trabalho remoto instaladas, as coisas fluíram melhor. É claro que todo bom gestor entenderá que esse não é um home office em “CNTP” (Condições Normais de Temperatura e Pressão), pois sem as creches e escolas abertas, o apoio dos avós para ficar com as crianças ou mesmo das nossas “ajudantes do lar” fica humanamente impossível concluir as tarefas do trabalho nos prazos corriqueiros. A quarentena forçada tem sido um excelente laboratório de empatia. Uma sensação frequente que me acompanhou nessa semana foi a de estar vivendo como num filme, custando a acreditar que era tudo real. Ao acordar, a primeira ideia que me vinha à mente era a de ter que me vestir para sair de casa e ir trabalhar. Mas logo eu precisava dizer ao meu cérebro que hoje o trabalho seria feito de casa mesmo.
Comecei a sentir falta do trajeto para o trabalho, de pegar o carro ou o metrô, de ver gente, de sair para almoçar, da rotina do dia a dia. Aquela rotina que tem sempre algo que nos irrita e que vivemos pedindo uma oportunidade para mudar. Pequenas coisas do cotidiano e que, por estarmos agora privados delas, fazem uma falta enorme. Foi uma semana em que fiquei mais reflexiva, introspectiva também. Em alguns momentos chorei de saudades dos meus pais que estão sozinhos sem contato com ninguém. Me senti mais cansada por ter que conciliar tão de perto as demandas da casa e do trabalho e ainda cuidar de uma bebê tão pequena.
Mais uma vez, após algumas muitas conferências telefônicas e muitos e-mails depois, missão cumprida e trabalhos entregues.
Terceira semana
Agora estamos na terceira semana de home office. Acho que já introjetei que nem tão cedo poderei voltar a andar tranquilamente pelas ruas ou a trabalhar na minha baia, rodeada por colegas e amigos. A ausência de uma data certa para a volta à normalidade é algo que angustia bastante. O cenário econômico que se avizinha e a situação dos mais vulneráveis também é de dar pânico. De outro lado, parece que o trabalho a ser feito de casa ficará cada dia mais facilitado e próximo do que tínhamos nas dependências do Banco. É claro que ainda precisamos aprender a domar o ímpeto das mil mensagens por dia nos grupos do trabalho e toda a boa etiqueta que permeia essa nova forma de exercer nossas tarefas, mas já vislumbro ganhos muito positivos dessa quarentena e do trabalho a distância: (1) digitalização de processos do Banco que estavam para acontecer há anos, em especial a adoção de assinatura digital de documentos e contratos; (2) mudanças nas relações de trabalho, nas quais o que passa a contar é mais a entrega, o cumprimento da meta e menos a jornada ou a catraca; (3) relações mais colaborativas e empáticas; e (4) a importância de se ter uma liderança transformadora, merecendo destaque aqueles líderes de equipe que souberam fazer a diferença e guiar seus times em um momento tão único e crítico.
Certamente, ao final disso tudo, sairemos mais fortalecidos e cientes da nossa missão de empregados de um Banco de Desenvolvimento. Por ora, a ordem é ficar em casa esperando por dias melhores.