Claudio Braga de Abreu e Silva – Engenheiro aposentado da BNDESPAR |
Vínculo 1243 – O Brasil está passando por uma crise política sem precedentes, gerada pelo avanço das investigações da Operação Lava Jato e agravada pela divulgação das delações de 78 executivos da construtora Odebrecht, que atingiram todos os seus principais líderes e partidos políticos. O país está estarrecido e abalado por sua maior recessão econômica resultante da sua crise política, não enxergando um caminho para a superação desse episódio que abalou profundamente a nossa democracia. Afinal, a solução tem que ser democrática, aprovada pelo Legislativo, sancionada pelo Executivo, acatada pelo Judiciário e aceita pela população. A alternativa de uma ruptura constitucional, com revolução e tudo, sem dúvida não é um bom caminho. Daí vem a pergunta: seria possível fazer uma profunda reforma política, que nos permitisse sair da crise atual, aperfeiçoando a nossa democracia e Estado de direito? Acredito que sim, e proponho que ela seja feita por três medidas, que serão detalhadas posteriormente: 1) aumentar a celeridade e prioridade dos processos judiciais de crimes de corrupção e conexos; 2) aprovar lei instituindo os Acordos de Suspensão Processual (ASP) a serem feitos entre o Ministério Público (MP) e os políticos relacionados a crimes de corrupção e conexos, tendo como contrapartida sua punições e renúncias a cargos públicos atuais e futuros e/ou de nomeação; e 3) convocar Assembleia Constituinte para fazer a reforma política.
Inicialmente caberia ao Supremo Tribunal Federal (STF), ao Superior Tribunal de Justiça (STJ), aos Tribunais Regionais Federais e aos Tribunais de Justiça Estaduais criarem estruturas especiais para julgamento exclusivo de crimes de corrupção e conexos, praticados por políticos detentores de cargos públicos eletivos e de nomeação, com foro privilegiado ou não, em especial os relacionados à Operação Lava Jato e suas derivações. Também seria importante o STF restringir o foro privilegiado para somente os crimes cometi-dos no exercício e em razão do cargo, bem como decidir quanto à obrigatoriedade de aprovação pelas assembleias estaduais para abertura de processos contra governadores no STJ. Tais medidas objetivariam assegurar celeridade e prioridade às atividades processuais relacionados a crimes de corrupção e conexos em todas instâncias, indicando aos investigados e denunciados que eles poderão vir a ser condenados mais rapidamente, inclusive porque o foro privilegiado deixaria de ser uma forma de prolongar a tramitação dos processos. Vale dizer que o STF acaba de aprovar estrutura especial para os casos da Lava Jato, cabendo aos demais tribunais aprovar medidas semelhantes.
Tais medidas seriam de importância fundamental para que os políticos aceitassem dar o passo seguinte, que seria a aprovação pelo Congresso Nacional de uma lei feita com adaptação e ampliação das disposições do Art. 89 da Lei 9.099/95 e do Art. 77 Código Penal, que tratam, respectivamente, da suspensão processual e condicional penal. Tal lei disporia sobre os ASP que todos os políticos eleitos e ocupantes de cargos públicos envolvidos em atividades de corrupção e conexas, registradas em qualquer instância judicial, poderiam firmar com o MP competente, que as proporia, a qualquer tempo antes do julgamento em 2ª instância ou superior, definindo, caso a caso, as condições apresentadas a seguir:
a) punições para os acusados, envolvendo: reparação do dano, salvo impossibilidade de fazê-lo; proibição de frequentar determinados lugares; proibição de ausentar-se da comarca onde reside, sem autorização do juiz; comparecimento pessoal e obrigatório a juízo, mensalmente, para informar e justificar suas atividades; prestação de serviços à comunidade; e outras condições a serem especificadas pelo juiz, desde que adequadas ao fato e à situação pessoal do acusado;
b) renúncia pelos acusados a seus atuais mandatos eletivos e/ou aos atuais cargos públicos que ocupem por nomeação;
c) compromisso dos acusados de não se candidatarem a novos cargos eletivos e/ou de não aceitarem ser nomeados para novos cargos públicos por um período de, no mínimo, de 4 (quatro) anos, determinado pelo dobro da soma das penas mínimas dos crimes a eles imputados em todos os processos;
d) revogação da suspensão processual no curso do prazo do acordo: d.1) se o beneficiário vier a ser processado por outro crime ou não efetuar, sem motivo justificado, a reparação do dano; d.2) se o acusado vier a ser processado por contravenção; ou d.3) descumprir qualquer condição acordada quanto às punições e às renúncias a mandatos eletivos e cargos públicos atuais e futuros;
e) extinção da punibilidade declarada pelo juiz expirado o prazo, sem revogação;
f) não ocorrer a prescrição durante a suspensão do processo.
Assim, os ASP seriam propostos pelo Ministério Público competente, que, analisando cada caso, proporia as punições e obrigações para os acordos, a serem aceitas ou não pelos políticos, estando sujeitos à aprovação do juiz ou tribunal competente. Feitos os ASP, caso as punições e obrigações não fossem cumpridas nos prazos acordados, eles seriam revogados, restabelecendo-se o prosseguimento dos processos, sem correr o prazo de prescrição.
Como a corrupção no país foi generalizada, com participação de todos os principais partidos e líderes políticos, é certo que os políticos somente aprovarão leis que os punam caso lhes sejam concedidos benefícios.
De um lado, estão os políticos, cujas grandes vantagens com a anistia proposta seriam não virem a ser presos e terem seus processos extintos após completados os prazos acordados. Além de multas e outras penalidades propostas pelo Ministério Público, deles seria exigida a renúncia aos seus atuais cargos públicos, eletivos e de nomeação, e o compromisso de não os exercerem durante o período do acordo. A existência de provas cabais dos processos, decorrentes das delações premiadas, aumenta a probabilidade de condenação. Além disso, caso seja dada celeridade e prioridade aos processos de corrupção, haverá redução do prazo para seus julgamentos. Esses dois fatores pressionariam os políticos a aceitarem os APS.
De outro lado está a sociedade, cuja grande vantagem com esta proposta seria o afastamento espontâneo dos atuais políticos dos seus cargos públicos, o que resultaria uma grande renovação da nossa classe política. Isso não seria pouca coisa, pois recuperaria a nossa autoestima e nos ajudaria a reconstruir nossa abalada e jovem democracia. Afinal, atualmente as pessoas de bem, que podem contribuir efetivamente para o desenvolvimento do nosso país, não se interessam por exercer cargos públicos, pois a atividade política passou a ser considerada espúria e marginal. Precisamos de bons políticos para orientar os nossos caminhos, que certamente aparecerão caso a política passe a ser coisa séria.
Por fim, seria aprovada a convocação de Assembleia Constituinte, a ser eleita em 2018, com o fim específico de elaborar a reforma política, que aqui não será comentada. O importante é que a Assembleia Constituinte seja composta por políticos de ficha limpa, sem ter corrupção em sua história. Para tanto, é importante que os eleitores escolham bem seus candidatos, não elegendo aqueles envoltos em corrupção e outros crimes.
Caso a anistia proposta seja implantada, todos os políticos que a ela aderissem não poderiam ser candidatos nas eleições dos próximos quatro anos, o que seria a nossa maior reforma política.
Face ao exposto, acredito que a saída para nossa crise política, da qual resulta na nossa crise econômica, passa por um pacto entre os políticos e a sociedade, o qual pode ser viabilizado pela discussão e aprimoramento da presente proposta.