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Desinvestir é uma estratégia perdedora para o BNDES

Arthur Koblitz – Economista, presidente da AFBNDES, recém-eleito para integrar o Conselho de Administração do BNDES

Vínculo 1426 – A estratégia da atual diretoria do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) de acelerar os desinvestimentos da carteira da BNDESPar —braço de participação acionária do Sistema BNDES— no meio de uma das maiores crises econômicas da história resultou num prejuízo nominal da ordem de R$ 12 bilhões.

Diversos investidores privados comemoraram a “liquidação Covid da BNDESPar”. Somente no “maior ‘block trade’ da história”, como foi celebrado pelo presidente do BNDES num tuíte em agosto de 2020, o banco alienou 135 milhões de ações ao preço de R$ 60,26 por ação, resultando numa venda total de R$ 8,1 bilhões pela BNDESPar. Hoje, essa carteira valeria R$ 14,1 bilhões, e a BNDESPar ainda deixou de receber R$ 325 milhões em dividendos. O prejuízo para a instituição, portanto, dessa única operação, está na casa dos R$ 6 bilhões.

Fazendo a mesma conta para casos públicos de desinvestimento (usando a cotação em 8 de janeiro de 2021) chegamos ao número de R$ 12,2 bilhões de prejuízo. O valor total do prejuízo está concentrado em quatro principais desinvestimentos realizados: Petrobras (R$ 1,3 bi), Vale (R$ 7,5 bi), Suzano (R$ 2,5 bi) e Marfrig (R$ 0,8 bi). Esses ativos no momento de suas vendas tinham forte expectativa de valorização perante o mercado. Os desinvestimentos entre dezembro de 2019 e novembro de 2020 atingiram quase R$ 44 bilhões! Quase todos os desinvestimentos foram feitos após o aprofundamento da crise mundial causada pela pandemia do coronavírus.

Que urgência poderia justificar essa liquidação de ações? A resposta certamente não foi o uso de recursos para combate à crise econômica. A evolução do balanço do BNDES entre o 3º trimestre de 2019 e o 3º trimestre de 2020 mostra que a carteira de crédito do banco encolheu R$ 10,5 bilhões.

A resposta também não vai ser encontrada na aplicação de recursos ao saneamento, como é constantemente propalado. O investimento em saneamento sofre para se recuperar. A verdade é que as alienações da carteira de ações tiveram até agora apenas um destino: “aplicações interfinanceiras de liquidez”. Estas aumentaram de R$ 57,8 bilhões em setembro de 2019 para R$ 129,7 bilhões em setembro de 2020 e devem ter atingido valor próximo a R$ 150 bilhões ao final de 2020.

Para justificar a venda acelerada de ações, a atual diretoria inventou ainda a história de que o BNDES estaria sob grande risco caso atravessasse uma crise dado o alto grau de concentração da carteira da BNDESPar. Argumentou-se que o VAR da carteira (medida de risco) era muito alto e similar ao de Hedge Funds. Essa ameaça da carteira da BNDESPar vai contra toda a história de uma instituição que existe desde 1975. De lá para cá não faltaram crises e o BNDES nunca se viu ameaçado. A BNDESPar não opera fundos líquidos e, portanto, não está sujeita a resgates imediatos de investidores de curto prazo. A comparação com Hedge Fund não faz qualquer sentido.

Os técnicos do BNDES sabem desses fatos. Para adotar a atual estratégia a diretoria afastou os mais experimentados, deu poderes e informações inéditas a assessores externos e estabeleceu uma mudança radical em normativos e processos. Não há precedente na história do BNDES para um mudança dessa radicalidade.

A notória preponderância de administradores egressos do mercado financeiro na diretoria e no Conselho de Administração do BNDES deveria recomendar cautela especial com ações que geram benefícios bilionários para seus antigos (e futuros?) empregadores.

Publicado na Folha de S. Paulo em 20/01/2020.

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